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Gostaria de entrar e tomar uma xícara da bebida de Satã?

Por History Channel Brasil em 03 de Agosto de 2016 às 15:54 HS
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É natural temer o novo. Foi assim com o café, que chegou a ser chamado de bebida de Satã, e o telefone, um instrumento do diabo.

No Oriente Médio, quando surgiu o café e as cafeterias, o poder dos sultões foi abalado. O povo passou a se encontrar para tomar café e acabava discutindo política, o que não agradou em nada as autoridades. Quando a bebida chegou à Alemanha e ao Reino Unido competiu com a cerveja e, quando chegou à Itália e à França, competiu com o vinho e o leite. Não houve dúvidas: tratava-se de uma bebida de Satã e era melhor evita-la.

Essas e outras controvérsias criadas pelo surgimento de um produto ou uma tecnologia nova são objeto de estudo do pesquisador Calestous Juma, do Centro Belfer para Ciência e Assuntos Internacionais da Harvard Kennedy School, nos Estados Unidos. Ele analisou seis séculos de história para identificar o comportamento humano frente às novidades e lançou o livro "Inovação e seus inimigos: por que as pessoas resistem às novas tecnologias".

"Aqueles que não gostavam de um produto tratavam de demonizá-los, dando a eles nomes pouco atraentes”, explica Juma.

Quando os telefones apareceram, os suecos o chamaram de instrumento do diabo, porque representava uma ameaça para as relações comunitárias. "Em vez de as pessoas se encontrarem para conversar frente a frente, o aparelho as distanciava”, conta o pesquisador.

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Juma identificou quatro categorias que se aplicam a muitos casos de resistência a mudanças: intuição, interesses criados, argumentos intelectuais e fatores psicológicos. 

O trator, por exemplo, foi um dos alvos. "Eles foram muito polêmicos porque realmente transformaram a vida nas fazendas. As pessoas costumavam usar animais como fonte de energia. Os animais estavam completamente integrados ao dia a dia. Eram alimentados e se reproduziam. A chegada dos tratores significou que os fazendeiros tinham que obter o maquinário de outra pessoa e comprar peças porque a máquina não se reproduzia. Houve protestos: os animais se reproduziam, os tratores se depreciavam".

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É uma questão de sobrevivência

Essa resistência ao novo nem sempre pode ser tachada como irracional. Por exemplo, o medo de que os cultivos transgênicos dependam das grandes empresas multinacionais que são donas das sementes ou de que as plantas pouco a pouco percam sua capacidade de se reproduzirem naturalmente não devem ser qualificadas assim.

Como no caso do trator, algo muito básico está em jogo: a comida. "Quando as pessoas se opõem a um produto, têm razões para isso. É o que digo no livro. Não devemos desconsiderar a oposição dizendo se tratar de ignorantes. Devemos escutar e considerar se concordamos com seus argumentos ou não", explica Juma.

"As pessoas não se opõem às coisas porque elas são novas, mas porque percebem um prejuízo em potencial”, concluiu o estudioso.


Fonte: BBC
Imagem café: Deliverance/Shutterstock.com
Imagem trator: Svetlana Foote/Shutterstock.com
Imagem telefone: Everett Collection/Shutterstock.com